Un Giardin sul Balcon

"Non ghe xe erba che la varda in sù che non la gabbia la so virtù" (da tradição vêneta)

quinta-feira, 3 de novembro de 2011

O Horto

O Horto, delimitado por uma treliça, é composto de dezoito canteiros retangulares de vime trançado, com caminhos de toquinhos de castanheira (uma linda ideia para aproveitar os galhos menores das árvores abatidas: no paisagismo). As plantas foram organizadas tematicamente:

1. plantas alimentares de folha: ervas do campo e folhas de salada - rúcula, chicória, borragem, aipo, funcho, acelga, alface, agrião, mostarda, cardo e um misterioso "atreplice", todas citadas já por Carlos Magno, rei dos francos, no famoso decreto que determinava as espécies a serem cultivadas nos hortos do reino.

2. plantas alimentares de raiz/bulbo: cebola, alho, echalote, cenoura, bardana, raiz-forte e cia. Desempenhavam um papel central na alimentação medieval por serem de fácil conservação.


3. Legumes e cereais: aveia, trigo sarraceno, espelta (colhidos na primavera), feijões, grão de bico, ervilhas, favas e feno-grego (colhidos no verão e no outono).

4. Curcubitáceas e hortaliças de fruto: pepinos, melões, abóboras de pescoço e berinjelas foram trazidos, quero dizer, levados pelos romanos desde o norte da África e a Índia. Tinha também uma tal de abóbora selvagem (será q tem alguma coisa a ver com a banda Kid Abelha?) que hoje é considerada venenosa, mas foi bastante consumida na idade média, inclusive pelo rei Carlos Magno.

5. Ervas condimentares:sálvia, alecrim, segurelha e orégano são ervas mediterrâneas, que passaram a ser cultivadas também no norte da Itália em função dos princípios da Escola de Salerno, a mais importante instituição médica da antiguidade, que até hoje é referência mundial em fitoterapia e organiza jornadas de curas naturais (mas esse seria outro capítulo...).

6. plantas espontâneas: funcho, alcaravia, cominho, levístico, cerefólio, salsa, manjerona...isso é para a gente ver que muitos dos temperos que empregamos eram "capoeira", "matinho" para os europeus. Creio que devamos estudar mais as nossas próprias ervas, a fim de que elas deixem de ser "não-convencionais" para nós.

7. plantas para tecido e uso doméstico: linho e cânhamo (sim, a própria Cannabis sativa), plantas cujo fruto servia de instrumento para cardar a lã ou raizes que coalhavam queijo, ou mesmo a saponária (Saponaria ocymoides), que servia como xampu.

8. plantas para extrair corantes: dessas eu só conheço a isatis (Isatis tinctoria) e o açafrão (Crocus sativus), azul e amarelo, respectivamente.

9. "O Jardim de Maria": olhem só que tri: em cada horto medieval, havia um setor reservado às plantas consagradas à Nossa Senhora, em geral rosas delicadas, lírios e outras flores que simbolizassem pureza.

10. plantas decorativas: serviam para fazer tapetes de flores nas procissões, costume que algumas cidades do interior gaúcho ainda preservam no dia de Corpus Christi - centáureas, papoulas, margaridas, sálvias do tipo alegria-do-jardim.

11. Venenosas: belladona, digitalis, arruda, acônito, serviam para matar, afastar o diabo ou salvar vidas, quando usadas com cautela, como as duas primeiras, muito úteis nas arritmias cardíacas até hoje.

12. Mágicas: plantas que, na tradição medieval, eram ligadas aos signos, à bruxaria ou à alquimia, como a mandrágora e a alchemilla.

13. Sinais da Natureza: a medicina medieval associava a morfologia da planta ao órgão que ela deveria curar ou favorecer. Assim, temos associações que perduram até hoje na medicina popular, como a pulmonária para os pulmões e a hepática para o fígado. Vi isso outro dia, no relógio das ervas que a Emater ensina a fazer. Aqui no Brasil, vejo frequentemente confundirem a Stachys byzantina (lambari de horta) com a pulmonária, que é essa aí embaixo:


14. panaceias: malva, calêndula, betônica (mais conhecido que a betônica - expressão popular ainda em uso), angélica (que diziam curar até a peste) e sálvia (quem tem salvia, admiro-me que morra - máxima salernitana).

15. relacionadas com o sangue: aquiléia, potentilla (potentilla anserina) e hipérico - ervas que sempre se tinha à mão, no estojo de primeiros socorros, pois estancavam hemorragias e curavam feridas.


16. digestivas e purgativas: o povo sempre acreditou no poder das ervas amargas em favorecer a digestão e estimular o apetite. São vários os bitters e digestivos ao redor do mundo que o atestam: o unicum húngaro, o chartreuse francês, todos os amari italianos...meu tio-avô gaudério, tio pedro, casado com a minha tia-avó Leta, irmã da minha avó, gostava de uma folhinha de losna num copo de água gelada na manhã do reveillon. Lentilha e carne de porco à meia-noite, ninguém merece mesmo.

17. anti-térmicas: altea, filipêndula, verbasco - espontâneas no campo, trazidas para os jardins murados dos castelos para agir como aquele paracetamolzinho que todo mundo toma de vez em quando. Antes dos antibióticos, baixar as febres devia mesmo ser questão de vida ou morte.

18. plantas para "doenças de senhoras": geralmente, os tratados de erborística eram escritos por homens, mas sempre havia muitas receitas para questões ginecológicas, quase sempre empregando melissa, losna ou arruda (pobrezinhas das pacientes!)

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