Un Giardin sul Balcon

"Non ghe xe erba che la varda in sù che non la gabbia la so virtù" (da tradição vêneta)

quarta-feira, 29 de junho de 2011

Sapato de Pau

Infelizmente, meus visitantes do fim de semana não conseguiram ver a Lagoa da Harmonia. Subimos o morro, mas não se enxergava um palmo na frente do nariz, como se pode ver pela foto acima.

Nem só de Lagoa vive o turismo em Teutônia. Acho encantadora a oficina de galpão dos Fangmeier, lá na estrada da Harmonia, porque se nota que é legítima, usada de verdade, no dia a dia, desde que os primeiros colonos aportaram por aqui. A gente se sente dentro de um romance do Josué Guimarães, com aqueles imigrantes rústicos e móveis de tábua falquejada. Aqui se fabrica o símbolo da região, o sapato de pau, uma espécie de tamanquinho, muito semelhante àquele das holandesas, hoje em dia usado apenas pelos grupos folclóricos locais. Eu confesso que comprei um par, mas para usar como peso de porta. Ficou um amor!


O Herr Fangmeier nos recebe com muita solicitude e, a despeito da barreira da língua, mostra tudo com orgulho. As ferramentas que vieram da Alemanha, com seus antepassados, ainda estão penduradas na parede. As mais "modernas" só estão menos gastas, mas são iguais. A partir de toquinhos de cedro, ele entalha, verruma, lixa e enverniza, até obter um lindo sapato de pau. Aliás, os Fangmeier são falantes do Plattdeutsch, o dialeto "sapato de pau", que soa aos ouvidos como uma mistura de alemão e holandês. 

 
E só para registro, aqui está uma amostra autêntica do paisagismo imigrante. Panelas, escorredores, chaleiras e até penicos não vão fora, mesmo quando furados ou sem alça. Viram belos vasos de flor reciclados. Shabby chic regional hein, que tal?

Rosada

Difícil acreditar que as duas fotos tratam da mesma receita, né? Mas é isso mesmo. Eu nunca acerto de primeira. Sempre experimento várias vezes. Ainda na confeitaria, onde se deve emulsionar precisão científica e sensibilidade estética. Esse pudinzinho achatado, aqui da foto de baixo, foi a primeira tentativa, a partir do livro La Cucina - Regional Cooking of Italy. Gostoso, mas feioso. Daí foi só introduzir umas modificações: ao invés de deixar as amêndoas na massa, eu só aromatizei o leite com elas. Acrescentei a tintura de beterraba, para uma corzinha mais saudável. Ao invés de estruturar o doce com ovos e forno, apelei para a gelatina e a geladeira. No acabamento, geleia de merlot e pétalas de rosa matizada do meu giardin.

terça-feira, 28 de junho de 2011

Sobremesas para o Frio

No último fim de semana, recebi a visita do meu querido professor, o Chef Moisés Basso, aqui em Teutônia. Como ele adora doces, coloquei todo o meu (incipiente) talento para a confeitaria em prática. Busquei receitas que remetessem ao clima de inverno que tanto amo. A primeira foi a torta de castanhas ali de cima. Quando falo em castanhas, me refiro àquelas portuguesas, de aparecimento recente nos mercados do sul, mas longamente conhecida na Europa. Lembro até de um fado português que diz assim:

Quem quer quentes e boas
Quentinhas
A estalarem cinzentas
Na brasa

Quem quer quentes e boas
Quentinhas
Quem compra leva mais calor pra casa...

Pois as tais castanhas são horríveis de abrir. Eu usei a faca para quebrar a casca externa e depois assei para tirar a película. Daí, fervi no leite, para que amolecessem e tentei passar no passa-verdura. Não deu. Foi para o processador mesmo. Misturei 300g desse purê com 100g de chocolate meio-amargo derretido, 100g de nozes picadas, 100ml de xarope de bordo (maple syrup) e 500ml de creme de leite fresco batido, integrado a um caramelo de açúcar mascavo, limão e água. Esse era o recheio. A massa era uma pasta frolla que eu tinha pronta, com canela e allspice (pimenta da jamaica moída). Pasta frolla é a base dessas tortas e cheesecakes e se faz assim:

Fazer um morrinho com 500g de farinha de confeitaria. Cavar um buraco no meio dele e colocar ali 200g de açúcar refinado, os temperos e 3g de fermento em pó. Misturar. Fazer de novo o buraco e colocar ali 250g de manteiga em ponto de pomada (que é aquela que passa a noite fora da geladeira) e integrar, fazendo uma farofa, mas sem manusear demais. Fazer o morrinho de novo, cavar o buraco no centro e colocar ali dois ovos e uma gema (daqueles ovões de galinha criada solta, ciscando, que tem a gema beeem amarela). Integrar de novo, envolver em filme plástico, deixar meia hora na geladeira antes de abrir. Abrir é que pode ser o problema, porque ela desmancha e rasga à toa. Para minimizar, a gente enfarinha de leve (mas de leve mesmo) o rolo, as mãos e a tábua e abre logo, sem delongas. Não precisa untar a forma porque pasta frolla é pura manteiga.

Daí, é só montar: pasta frolla na forma de torta, recheio dentro, fitas de pasta enfeitando, cortadas com a carretilha (que é aquela rodelinha de bordas frisadas) e 40 minutos no forno pré-aquecido a 180C. Eu sempre uso calor em cima e embaixo, que é um ótimo recurso do meu forno. Também costumo girar a forma, porque os fornos sempre assam mais atrás do que na frente.

Bom mesmo é comer esse doce quentinho e recém-feito, com uma bola de sorvete de creme ou uma colher de nata batida. No dia seguinte, fica meio farelento e sem graça. 

Já a Gubana é um doce muito antigo, lá do Friuli, e remonta aos pães de frutas secas e especiarias da Idade Média. A Toscana tem o panforte, a Lombardia tem o panetone, o Vêneto tem o pandoro e o Friuli tem a gubana. A receita mais antiga desse doce vem lá do fim do Império Romano, quando o Friuli foi um Estado religioso independente, o Principado da Aquiléia. Antes de inventarem a massa folhada, dava muito trabalho fazer a massa, que tem fermentação dupla, como a do panetone. Agora, graças à Arosa, eu compro massa folhada em pacote no super, abro, ponho o recheio e enrolo, dando a forma característica de caracol daí de cima. Pincelo com gema de ovo e asso por 40 minutos em forma untada em forno pré-aquecido a 180C, calor em cima e embaixo. O que é o recheio? Ah, tudo de bom que a gente tem na despensa: dessa vez, usei nutella, um pedaço de chocolate com avelãs, nozes, passas que ficaram de molho no vinho licoroso, casquinhas de laranja cristalizadas, canela em pó e cardamomo, além de açúcar, duas claras em neve bem firme e uma gema para integrar. Esse doce também é melhor quentinho, com algum xarope de frutas ou calda de licor por cima. Até um gole de graspa serve de calda.

terça-feira, 21 de junho de 2011

Almoço em Família


Minha sogra, leitora assídua do meu blog e grande colaboradora do giardin, queria muito experimentar uma refeição "de chef". Então, no último domingo, convidei a famiglia Czekster (a parte que está no Brasil) para um almoço em minha casa. Este foi o cardápio:

Antipasto: Tavola di Salumi
Primo piatto: Pasta alla Zìngara
Amuse-Bouche:  Verdure in pastella
Secondo piatto: Brasato al Merlot
Contorni: Fagiolini alla provola e Polenta
Dessert: Cheesecake ai mirtilli e fragole
Piccola Pasticceria (Frollini) e Liquori casalinghi
Pane all'erbe

Em tempo: o cardápio em italiano não é uma afetação, mas uma decorrência do que aprendi na escola, o ICIF - Italian Culinary Institute for Foreigners. A Universidade de Caxias do Sul tem um convênio com esta instituição piemontesa, cuja matriz é em Costigliole d'Asti e que possui ainda uma filial em Shangai, na China.

Dito isso, traduzo:

Entrada: tábua de embutidos regionais
Primeiro Prato: massa "à moda cigana" (linguiça, frango e presunto em molho cremoso de tomate)
Petisco: verduras empanadas
Prato Principal: carne de panela marinada e cozida em vinho merlot
Acompanhamentos: vagens gratinadas com queijo tipo Provolone e polenta
Sobremesa: cheesecake com calda de mirtilos e morangos
Biscoitinhos e licores caseiros
Pão de ervas

Posto isso porque acho interessante mostrar um cardápio montado, ao invés dos pratos isolados que usualmente mostro no blog. Peguei pesado nas carnes porque conheço as preferências alimentares dessa família, particularmente apaixonada por embutidos. Escusado dizer que todas as ervas empregadas vieram direto do meu giardin sul balcon...

segunda-feira, 20 de junho de 2011

Marinada


Uma marinada é um preparado aquoso condimentado e ácido, com percentual variável de gordura, onde a comida é imersa com o objetivo de sofrer alterações em sua textura e seu sabor. As marinadas podem ou não participar do cozimento, pelo que são classificadas como cruas ou cozidas. Este é um exemplo da última categoria, feito com minhas próprias ervas: mergulhei pedaços de paleta bovina numa mistura de cebolas, cenouras, louro, tomilho, cravo, canela, sálvia, alecrim, zimbro, grãos de pimenta preta, um punhado de sal, 50ml de azeite e muito vinho tinto, no caso, um merlot. Deixei repousar por 24h na geladeira, retirei a carne e sequei bem, do contrário, não pegaria cor ao ser selada na panela. Selei em azeite quente, removi da panela, coloquei os ingredientes sólidos coados para que refogassem bem, devolvi a carne à panela, devidamente salgada e, por cima, o vinho, cozinhando em panela tampada por quatro horas. Ao fim desse tempo, retirei a carne outra vez, passei o molho pela peneira duas vezes, reduzi pela metade e o servi sobre a carne fatiada com polenta. Escolhi uma carne dianteira porque a rigidez de suas fibras e seu alto percentual de gordura são essenciais para aguentar esse processo de cozimento tão prolongado, conhecido como brasato na culinária italiana. Um processo ainda mais longo produz o stracotto, em que as fibras virtualmente se desfazem. Lembra um pouco o barreado paranaense, que comi em Antonina, ao passear de trem até o Porto de Paranaguá.

Mesa de Inverno



No fondue-relâmpago da semana passada, decidido e marcado em plena terça-feira, recorri ao jardim na hora de decorar a mesa: apenas folhas e flores de manjericão roxo ruffles, acelga roxa e curry foram suficientes para criar o clima, com suas folhas rugosas e aveludadas e seus tons frios de púrpura e cinza. Fiz um rápido arranjo baixo, que ficou de lado para não competir com a panela, acrescentei vasinhos individuais com mais ramos de manjericão e, ainda, uma delicada folhinha sobre o guardanapo de tear artesanal, preso com barbante. Algumas velas e, como toalha de mesa... um cobertor de lã! "Uma mesa quentinha", nas palavras do Enrico.

segunda-feira, 13 de junho de 2011

Dia dos Namorados

"Faceiro que nem cusco de cozinheira" - Assim os gaúchos descrevem uma pessoa que está bem nutrida, contente, que tem sido bem tratada. (Aparte linguístico: "Cusco", para quem não fala gauchês, é cachorro de estimação. "Jaguara" é cachorro de rua, andarilho e "Guaipeca" é cachorrinho à toa, pequeno e atrevido). Pois foi assim que o Gusta se descreveu depois do almoço do último domingo, dia dos namorados. Ele parecia mesmo faceiro com a ideia de pedir de presente uma refeição caprichada.

Como primeiro prato, eu servi uma massa à minha moda: um soffritto de cebola picada fininho, tirinhas de bacon e pimentão vermelho com molho de tomate bem grosso, sal, peperoncini e cebolinha, picada com a tesoura, já na hora de servir.
O segundo prato é um dos top-ten do Gusta: saltimbocca alla romana. Esses escalopinhos de alcatra são batidos bem fininhos e depois ganham uma fatia de presunto e uma folha de sálvia como companheiros. Eu usei um presunto tipo culatello, que é um presunto cru, mas magro. O certo é usar presunto de parma. Eles são fritos em manteiga e regados com vinho.
Como contorno, ao invés do tradicional espinafre que acompanha os saltimbocca, eu fiz um refogado de alho poró e talos de cebolinha com bacon, pimenta e azeite, num mínimo de água, por cerca de cinco minutos.
  
 Era um almoço em casa, mas até que eu me comportei na hora de servir...
E só para não dizer que não falei de morango, a fruta oficial do dia dos namorados (embora esteja completamente fora de época), aqui está a sobremesa do dia: uma cheesecake com calda de mirtilo e cabernet sauvignon com um moranguinho em cima. Essa pasta frolla ficou bem boa, porque, além de manteiga, farinha e açúcar, eu coloquei canela. O recheio é ridículo de tão fácil: queijo tipo mascarpone e creme de leite fresco batido com açúcar. A calda eu fiz assim: umas duas xícaras de mirtilo, 3/4 de xícara de açúcar, meia taça de vinho. Misturei os mirtilos meio esmagados com o açúcar já no fogo, fiz a calda e acrescentei o vinho, deixando o álcool evaporar por uns três minutos. Acho que só vou repetir a receita no ano que vem, porque é um perigo para a cintura ter essa torta por perto.

sábado, 11 de junho de 2011

Berga Chic

Eu tenho um histórico lamentável com bergamotas. Uma malfadada aposta levou-me, ainda na infância, a comer um número estratosférico de bergas "numa sentada", como se diz por aqui. Resultado: gosto da aparência, gosto do cheiro, mas comer... nem pensar! Argh! Essa receita, contudo, voltou a deixar a fruta palatável para mim: descascar três bergamotas, fazer suco com duas delas. Reduzir o suco com uma colherada de mel e baunilha, banhar a fruta que ficou inteira e assá-la em forno pré-aquecido a 180C por trinta minutos, sempre banhando com a calda e virando para que asse de modo uniforme. Ao retirá-la do forno, cobrir com a calda, enfiar um biscoito despedaçado dentro da bergamota e finalizar com uma calda de chocolate. Parece que eu fiz essa sobremesa chic só com as sobras da semana? A manta de drenagem dos meus vasos também ficou tri fotogênica, né?

Alla Czarina

Como todos sabem, o endro (Anethum graveolens) detesta transplantes. Suas raízes delicadas não toleram a mínima perturbação. Apesar de saber da interdição, ousei incomodar meu endro, pois precisava livrá-lo de uma terra repleta de pragas. Imaginando que ele poderia não sobreviver à cirurgia, aproveitei os ramos mais tenros numa massinha descompromissada. O salmão em lata ressuscitou ao ser flambado na vodca, salteado na manteiga, misturado com nata e polvilhado de endro e pimenta. Ao viajar do Alaska até Jaguarão, contudo, perdeu um tanto da sua cor. Tive de recorrer a um blush vindo do giardin: um golinho de suco de beterraba. A czarina aprovaria, com certeza, meu pequeno truque.

Penne alla Czarina: canned salmon (not so pink after all the travelling from Alaska to my kitchen) flamed with vodca, sautèed in butter and mixed with cream, pepper and fresh dill. A hint of beet juice was a much useful make-up to raise my fish from the dead. Dill roots are better left undisturbed but I had to move my plants to a new container in order to avoid some pests. This may have been our farewell dinner... 

quinta-feira, 9 de junho de 2011

Risotto com vagens, ervilhas e manjericão

Há noites em que tudo o que se quer é um prato de arroz quentinho. No freezer, eu tinha: um pacote de ervilha congelada, um pacote de vagens branqueadas e um brodo maravilhoso, feito com uma bandeja de sopão, daquelas vendidas no super, de mil verduras picadas. A partir daí, foi simples, como toda comfort food deve ser: saltear a cebola na manteiga, fritar o arroz, acrescentar o vinho, deixar evaporar e, a partir daí, uma concha de caldo fervente por vez, mexendo sempre, durante dez minutos. Acrescentar as verduras, sal e pimenta e mais caldo, até o arroz ficar al dente. Apagar o fogo, mais uma colher de manteiga, mexer bem e servir, enfeitando com as folhas recém-colhidas de manjericão grecco a palla. Simples e eficaz.

PS: A receita em que me baseei mandava acrescentar raspas de limão, mas eu usei um pouco do meu pó de casca de lima e ficou muito legal. Só tem de cuidar, pois é muito mais forte que o de laranja e pode ficar enjoativo.

Sclopit (Silene inflata)

Sclopit: comment le cuisiner? Cher lecteur, excuse-moi de t'ècrire en anglais. Je comprends le français, mais je n'ècrive pas bien.

Sclopit is a spontaneous herb from Friuli, Italy, also known as erba silena or stridolo.

Fred Plotkin, in his book La Terra Fortunata, says: 'This peppery, slightly musty, and very grassy herb appears in spring and, in addition to appearing in herb mixes, very often appears on its own as a flavouring in risotto".

The risotto all' erbe spontanee is a good example of cooking with sclopit. In a heated pan, add olive oil, butter and a tsp of pancetta and then add a very well minced onion and a mixture of herbs, sautèe for a minute. Move the herbs to the side of the pan and fry the rice, proceeding as in any risotto from then on.

I figure that, like many other wild herbs, it can be used in salads, omelets, pizza toppings and sandwiches. When using the raw herb, prefer young and tender leaves, added towards the end of preparation. 

quarta-feira, 8 de junho de 2011

Festival das Laranjas 2

Estou vivendo uma "fase Laranja" na cozinha. Se alguém for alérgico à laranja, é bom me avisar, porque tenho colocado laranja em tudo, até no café. E tem coisa melhor? Está na época, a gente ganha de presente e é uma fruta muito, mas muito versátil, que pode ser inteiramente aproveitada. Prova do que estou dizendo é essa receita aqui: casquinhas açucaradas. Enquanto via tevê, descasquei as laranjas de suco antes de espremê-las e cortei as tirinhas. No dia seguinte, cozinhei as casquinhas em água levemente fervendo, trocando a água algumas vezes. Escorri, pesei e acrescentei à panela o mesmo peso de açúcar cristal. Cobri com água de novo. Deixei cozinhar por duas horas, até que as casquinhas absorvessem toda a calda e ficassem translúcidas. Espalhei sobre papel manteiga e joguei açúcar refinado. Sequei no forno já desligado, mas ainda quente, com a porta aberta. Levei um pouco para o serviço hoje e tudo foi instantaneamente fagocitado.

PS: O melhor dessa receita é que até eu gostei, porque não é amarga como as casquinhas que a gente compra prontas por aí. E olhem que eu odeio, mas odeio frutas cristalizadas. Cheguei a integrar uma comunidade no falecido Orkut chamada "Eu odeio frutas cristalizadas". Pensando melhor, o que eu desgosto é a ruptura na expectativa sensorial, a pegadinha. Não tem coisa mais desagradável que a gente morder um bolo, esperando achar aquele colchão fofinho de consistência uniforme e esponjosa... e dar com o dente num corpo estranho, meio doce, meio amargo, feito um pedaço duro de gelatina. É por isso que cucas, panettones e cassatas passam batidos por mim, nem ligo. E o que dizer dos sádicos que põem essas coisas em salgados então! Bah! Bota brincadeira de mau gosto nisso. Mas comer pura, assim, bem visível, até que é bem bom...

Picasso had it blue, VanGogh had it yellow... I am in an Orange Period. If any of my friends is allergic to oranges, it is wise to warn me, because I'm adding orange to virtually everything, including coffee. Can't get any better than this: it is seasonal, it is a common gift this time of the year and it is a wild card, which can be wholly consumed, as illustrated by this recipe: candied orange peel. While peeling the oranges you make juice with, mind letting the white part attached to the fruit, because this is the sourness you don't want in your candy. Then, cut it as you like, I prefer long, thin strips, and toss in a pan and cover with water. Gently boil it for about an hour, changing the water 2 or 3 times. Drain, weight and add the same weight in granulated sugar, barely covering with water. Simmer until the peel is translucent and nearly all syrup has been absorbed. Let it dry for a day over parchment paper and then sprinkle confectioners sugar all over it. This delicious treat can be stored in jars for up to 6 months and is a marvellous companion to a cup of coffee or hot tea. 

Sweet Babies






Pessoal, essas são para quem gosta de acompanhar o cotidiano do giardin. Tem feito muito frio para jardinar, de maneira que tenho cuidado dos brotinhos indoors mesmo. As sementes novas germinaram bem, com exceção de algumas mais preguiçosas. No inverno, é bom não incomodar muito as plantas, pois elas fazem uma espécie de hibernação e economizam energia. Algumas a gente tem de proteger da geada, como a salsa e o coentro e todas aquelas cujas folhas são fininhas. É importante reduzir as regas, a fim de evitar a umidade que trará fungos e viroses. Nessa época, uma aplicação de calda bordalesa é um reforço interessante, como uma sopinha quente para as plantas. Calda bordalesa é uma mistura de sulfato de cobre e cal hidratada, muito boa para fortalecer contra doenças fúngicas - verso la mufa, come se ghe dise in bon talian.

Entre Dois Amores

Ontem, ganhei uma sacola de maracujás. Hoje, inventei essa sobremesa com eles. Chamei de "Entre Dois Amores" porque imaginei o maracujá indeciso, incapaz de escolher entre a mousse de chocolate branco e o glaze de chocolate amargo. Se alguém quiser a receita, que como toda a receita de confeitaria é uma chatice meticulosa, me peça via comment que eu publico. Agora estou com preguiça. Só quis deixar vocês com inveja.

Yesterday, my lovely neighbor gave me a tote of passionfruits. With it, I invented this dessert. I named it "Between two lovers", because it is impossible to poor passionfruit choosing a partner: should it be the velvety and sweet white chocolate mousse? Should it be the strong, exquisite dark chocolate and cognac glaze? Maybe keeping both is the best solution...

Brutti ma Buoni

"Feios, mas gostosos". O nome é sincero. Esses biscoitinhos parecem vômito de cachorro, mas tem um gosto e uma textura maravilhosos, além de serem à prova de erro. Como é que alguma coisa pode não ser gostosa se leva avelãs? A receita é tradicional vêneta e se pode guardar na memória, pois é muito fácil. Fiz essa fornadinha ontem à noite, com três claras de ovo que sobraram de outro preparo. É assim que se faz:
Ligar o forno a 180C
Bater em picos firmes 100g de claras e 280g de açúcar
Tostar 300g de avelãs por uns dez minutos ou menos
Colocar as avelãs dentro de um pano de cozinha e esfregar bem, até que soltem as cascas
Passar no pilão as avelãs descascadas, moendo de modo irregular
Misturar avelãs nas claras com açúcar e levar a fogo baixo por oito minutos, mexendo sempre
Com a ajuda de duas colheres, "modelar" os biscoitos sobre a forma forrada com silpat
Baixar o forno para 140 e assar por uns dez minutos, cuidando para não queimar.
Quando retirar do forno, eles endurecerão ainda um pouco. Esperar uns cinco minutos e colocá-los sobre uma grade para que esfriem.
Minha vizinha, que ontem apareceu aqui com um saco de bergamotas, laranjas, caquis, limas e maracujás, mal perde por esperar. Vai ganhar biscoitos de avelã e casquinhas de laranja cristalizada como vingança, hahahahahaha...
Ah, ia esquecendo de comentar: já fiz essa receita acrescentando à mistura crua um gole de água de rosas, o que ficou bem legal. Ontem, coloquei uma colherada do meu pó de casca de laranja. A cor ficou mais dourada e o aroma da laranja deu um aroma de outono à receita.
Aqui na culinária regional da Serra Gaúcha, os brutti ma buoni perderam o nome e as avelãs, que foram trocadas por amendoins, mais fáceis de achar. Fica bom. E feio também!

'Ugly, but good' - this sincere name applies well to these hazelnut macaroons that may look like dog puke, but have wonderful texture and flavour, besides being fool-proof. Very simple to make: pre-heat the oven to 180C. Combine 100g egg whites and 280g sugar and whisk until very firm. Bake the hazelnuts for ten minutes, peel and crush. Add nuts to egg-sugar mixture (at this point I add a tbsp of my baked orange zest powder) and cook it over low flame, always stirring, for about eight minutes. Scoop lumps of the batch with the help of two spoons. Low oven temperature to 140C. Dispose the macaroons over a silpat lined baking sheet and bake for ten to twenty minutes, until golden. Let rest for five minutes before placing over a grid to dry. They will still harden a bit out of the oven. Here, in Serra Gaúcha Regional Cuisine, hazelnuts were replaced by peanuts. Also good. Also ugly as famine.

segunda-feira, 6 de junho de 2011

Aaaaahhh!

Gente, mil desculpas, mas o blogger psicotizou comigo e não me deixa postar comentários no meu próprio blog. Não sei se isso tem algo a ver com as invasões recentemente ocorridas ao google, mas li nos fóruns de ajuda do blogger que esse mesmo problema tem afetado muitos blogueiros ao redor do globo. Então, se eu demorar a responder um comment, por favor, culpem os hackers.

Alas! I feel very sorry I haven't been able to answer the kind comments of my readers, but the blogger has turned its back on me and I have not been allowed to enter my own club these last few days. While searching through the blogger help pages, I realized this is a generalized problem that may be related to the hackers attacks suffered by google last week. So please put the blame on hackers, not on me.

domingo, 5 de junho de 2011

Perdendo a Conta

Foi a Dani que me alertou: eu deveria ter bem mais de setenta variedades no meu Giardin sul Balcon (Jardim na Sacada). Admito que a estatística era antiga e que é difícil mantê-la, pois a guerra contra as pragas e as intempéries traz constantes baixas, ao passo que as germinações se sucedem, inabaláveis. Pois resolvi fazer uma recontagem e uma classificação, que aqui se seguem:

Frutíferas: cereja do rio grande, framboesa, uvaia, maracujá mini, maracujá azedo, romã, figo-da-índia, butiá, guabijú, mirtilo, limão, pitanga, figo e morango (14 espécies)

Ervas aromáticas: tomilho comum e variegado, alcaravia, tanaceto, pelargônio, endro, sálvia icterina, sálvia comum, sálvia purpurascens, alfavaca verde e roxa, manjericão africano, anão, genovese, napolitano, ruffles e grecco a palla, segurelha de inverno, menta, hortelã-brava, hortelã-pimenta, melissa, nepitella, cebolinha grossa e fina, funcho e funcho-bronze, cerefólio, alho social, cominho, erva-doce, estragão, lavanda francesa e lavanda inglesa, alecrim (duas variedades), curry, louro, açafrão da terra, gengibre, cren, salsa lisa, salsa gigante e salsa crespa, manjerona, orégano comum, orégano grego e orégano variegado, levístico, coentro, feno-grego, sclopit, bergamot, minutina  (54 espécies)

Verduras e legumes: menstruz, tomate-cereja amarelo, acelga, orach, berinjela mini eggs, pimentão vermelho, beterraba, portulaca e portulaca de inverno, caruru, aipo, espinafre, azedinha, rúcula, pissacàn, ora-pro-nobis, bertalha, pimpinella, mache, cardo e rampion, pimenta habanero, biquinho e dedo-de-moça, cebola roxa (25 espécies)

Flores comestíveis: viola odorata e wittrockiana, cravo, rosa, borragem, capuchinha, caliopsis, sweet william, centáurea, balloon flower, ervilha de cheiro, papoula, hissopo, calêndulas (14 espécies)

Chás: boldo, losna, arruda, aquiléia, poejo, hipérico, alevante, tanchagem, camomila romana, cidró, erva-cidreira e guaco (12 espécies)

E assim cheguei ao total estarrecedor de 119 variedades, no espaço exíguo de uma sacada, no segundo andar de um prédio, sobre uma agência dos correios. O número tende a se ampliar nos próximos dias, já que algumas das sementes que plantei ainda não germinaram. Outras, eu nem plantei. Também tenho um provável pezinho de cardamomo e um cravo-da-índia morto-vivo, além de duvidosos galhos de hibisco e, quem sabe, brotos de lúpulo.

Inspiração Oriental

Sábado à noite, assisti um filme em que a Brittany Murphy tenta aprender a fazer lámen, um tipo de minestrone japonês. O filme, The Ramen Girl (esqueci a obviedade que usaram como título na tradução), é uma mistura engraçada de Como Água Para Chocolate (o caldo de Abby faz as pessoas chorarem, como o banquete de Tita) com Tampopo - os brutos também comem spaghetti (um filme japonês nonsense). Abby é uma borderline típica: cruza o mundo atrás de um cara que recém conheceu, não dura mais do que três meses em um emprego, gasta as teclas do celular de tanto importunar o amado, aparece de toalha na rua, no meio de uma discussão. Nos primeiros minutos do filme, empatizamos com o cara que a abandona. A convivência com os japoneses logo exerce efeito calmante sobre ela. Abby aprende a ter paciência, a ser meticulosa, humilde e, o mais importante, admitir a existência do outro como algo independente, separado de seu próprio ser. O dono do restaurante, o mais improvável dos professores, vive processo semelhante: precisa aceitar o desejo do filho de seguir carreira longe do estabelecimento familiar. É interessante assistir sua evolução: da raiva autodirigida, na forma de um beber excessivo, para a raiva dirigida a Abby, que sofre todas as humilhações possíveis e, no fim, à resignação e ao surgimento de um novo caminho. É claro que tantos caldos, algas, cogumelos e legumes bem cortados açularam meu apetite. Enquanto via o filme, cortei repolho, cenoura e cebola, iscas de carne; busquei aipo, cebolinha e acelga no jardim, descongelei umas vagens e salteei tudo no óleo, por ordem de tempo de cozimento, com sal e molho de soja. Não era lámen, mas matou a vontade e manteve a proposta low-carb do meu fim de semana.  

Cenouras

Para acompanhar um simples e rápido vazio assado, lembrei de um acompanhamento que aprendi a fazer na Ana Maria Braga: um feixe de cenouras em palitos, unidos por uma fatia de presunto de Parma e por uma cebolinha. É só mergulhar as cenouras em água fervente por uns três minutos e imergí-las em água gelada (a temperatura ambiente de hoje serviu bem). Depois, fazer o mesmo com a cebolinha. Montar o feixe e grelhar em frigideira bem quente, usando a própria gordura do presunto para deixá-lo crocante. A Ana fez com bacon, mas acho que prefiro a complexidade de sabor da minha versão.
Esta é uma outra opção para contornar assados: assar em forno pré-aquecido algumas cenouras em rodelas, folhas de sálvia, sal, azeite, pimenta e dentes inteiros de alho, apenas esmagados.

Carrots are wonderful in both these ways: the first one is to cut and blanche them (3min in boiling water, 1 min in cold water) and then wrap a slice of Parma Ham around the bunch, tie with a blanched chive leaf and sautèe every side in a very hot pan, using only the grease from the ham itself. The other way, also nice with roasted meat, is to bake them with a drizzle of olive oil, salt, black pepper, some smashed garlic cloves and sage leaves.

Barszcz


Barszcz é uma das sopas mais clássicas da culinária eslava. Hoje resolvi fazer uma com a polpa que restou de um suco de beterraba. Acrescentei água, sal, pimenta e um gole de vinagre branco. Fervi por dez minutos. Coei. Servi com creme azedo e endro. Gosto dela assim, restrita a seus elementos estruturais. O melhor de tudo é que logo poderei fazê-la com uma beterrabinha colhida na hora, diretamente do meu jardim.

A classic soup of East European Cuisine, barszcz is a clear beet broth I like to keep simple: the juice of a beet, salt, pepper and white vinegar, simmered by ten minutes and served with sour cream and dill. A must for cold days like today. Some people add sugar to it. I think beet itself is sweet enough.

quinta-feira, 2 de junho de 2011

Gente Grande


E só para deixar vocês loucos de fome, posto aqui algumas criações recentes do meu mentor e amigo, o chef Moisés Basso. Costelinha de porco glaceada com goiabada e quenelles de purê de batata doce, petit gateau de doce de leite com requeijão. Esses pratos integraram um workshop de cozinha brasileira ministrado por ele na semana passada, na Escola de Turismo e Hotelaria da UCS, em Canela. O chef, com sua formação ultraclássica em cozinha internacional, bem que tentou me ensinar a servir essas porções tão bonitas, elegantes, comedidas... Obrigada, prof, por permitir a publicação!

This are some of the exquisite dishes my mentor, Chef Moises Basso, presented during a Brazilian Cuisine Workshop, which took place last week in the turistic city of Canela, Rio Grande do Sul: Pork ribs glazed with guava jam and sweet potato purèe, a doce de leite (a very sweet milk curd, speciality from South Brazil and Uruguay) petit gateau with requeijão (a kind of fat and velvety cream cheese, typical from the dairy region of Minas Gerais, Central Brazil). Some serious professional touch here, huh?

Berçário vertical

Olhem só como a gente tem de se virar quando o espaço é pouco e a vontade de plantar é muita. Minha sogra, Dona Beth, trouxe para mim aquelas sementes maaaaaravilhosas que mostrei outro dia. Como tem feito muito frio e eu queria poupar as plantinhas das pragas, improvisei esse jardim suspenso numa fruteira de cozinha. Junto a essa porta-janela, elas recebem um bom sol e muitas germinaram em menos de quatro dias! O recordista foi o feno-grego (Trigonella foenum-graecum), que eu acho que germinou de um dia para o outro. Quando os vasinhos acabaram, apelei para potes de sorvete e até embalagens plásticas de ovo. A gente faz um furinho embaixo e tá valendo. Ecológico, né?

This is how I have solved the equation: too much will to grow new seeds, no more space to do so. Going vertical, going indoors. I have been being tremendously impatient to plant those wonderful things my mother-in-law brought me from the USA the other day. So, I have improvised a mini-Nabucodonosor-suspended-garden in a kitchen cart by the window. The light they get is OK and they remain protected from the excessive cold. Well, most of the seeds did sprout in less than a week. The Speedy Gonzales prize goes to fenu-greek (Trigonella foenum-graecum), which showed itself the next morning. When I got caught out of containers, I ended up using ice-cream and eggs plastic boxes, pierced in the bottom. Desperate, but eco-friendly measures.

Jantando com Amigos

Nas palavras de Alain de Bottom, só passamos a existir quando alguém acompanha nossa existência, o que só passa a ter significado quando alguém consegue entendê-la. Viver cercado de amigos é ter constantemente nossa identidade confirmada; o fato de eles nos conhecerem e se preocuparem conosco tem o poder de nos tirar de nossa indolência. Epicuro, meu filósofo-jardineiro-gourmet preferido, julgava que um punhado de amigos sinceros pode prover o amor e o respeito que mesmo a riqueza não pode.

É por isso que adoro receber meus amigos (e leitores fiéis) Enrico, Bira e Dani, para uns convescotes in promptu, que a gente organiza de uma hora para outra, sem mais nem por quê, só pela vontade de exercer nossa convivência. Como se não bastasse a gente se ver a semana inteira no Posto de Saúde...

O fato é que Epicuro chegava a preconizar que nunca, jamais se fizesse uma refeição solitária, dessas que a gente come de pé, na pia da cozinha, porque está com preguiça de por a mesa. "Não somos lobos ou leões, somos seres humanos" - dizia o mestre - "e com quem se come é até mais importante do que o que se come".

Como eu vou passar uns dias fora de casa, chamei-os, ontem à noite, para fazer uns maccheroni frescos que eu havia comprado em Bento e que, com certeza, não sobreviveriam até o meu retorno. Nada pretensioso mesmo. Legal é que deu para testar meu lemon curd numa receita que vi o Jamie Oliver fazer naqueles programas em que ele cozinha uma refeição em meia hora. É um tipo de tortinha num copinho. Primeiro, moí uns cookies de chocolate, derreti uma colherada de manteiga na frigideira e juntei um punhado de avelãs, misturei tudo para fazer a base. Depois, bati meu lemon curd com umas colheres de mascarpone e açúcar de confeiteiro (por mim nem precisava açúcar, mas o Enrico e a Dani são chegados em coisas muuuuito doces). Por último, minha geleia de araçá-vermelho e umas folhas de menta do giardin, colhidas na hora. Deixei a apresentação assim, meio desconstruída, porque acho que tem um apelo psicológico profundo nisso, que o Jamie explora muito bem: o da comida nitidamente caseira, cheia de atavismos.

Mas o ponto alto da noite foi a pós-dessert. Nada demais a receita, eram só uns frapês de nutella, ovomaltine e amaretto, mas a ideia de comer uma sobremesa depois da sobremesa... A culpa vai às alturas e a gente se sente numa orgia romana, decadente, terrível! Só faltaram as tripas de urso com mel e as mamicas de porca recheadas com línguas de tordo e molho de peixe podre. Quem sabe da próxima vez.

PS: Para quem anda meio estressado, recomendo o método do Jamie de moer cookies: colocá-los num pano de prato, fazer uma trouxinha e espancá-los com vontade contra a bancada. Nas palavras dele, "beat the crap out of them"!